Lírio ou Rosa para o Pé Rapado?
Um pouco adiante de Lucas 1,39 de onde o Papa Francisco inspirou-se para imantar a Jornada Mundial da Juventude, em Lisboa, 2023, lembrando como Maria levantou-se apressadamente e foi ter com Isabel, Érico Verissimo em 1938 pegou emprestado Olhai os Lírios do Campo de outro capítulo de Lucas (12,27-31) e construiu um de seus consagrados romances. E Érico cometeu vários pecados, neste livro. Um deles ele crava nas primeiras páginas, tecendo a estrutura emocional de Eugênio, o principal personagem; diz Verissimo:
“Eugênio temia esse Deus que em vão a mãe lhe queria fazer amar…”.
Mais à frente o sacrilégio passa dos limites, embora à época do lançamento da Editora Globo ninguém dera bola, nem depois, até hoje: “Na escola, os outros meninos contavam vantagens e proezas de pessoas da família. «Meu pai já foi no Rio de Janeiro... O teu já foi?» «Meu tio derrubou um negro com um soco»…” – O personagem Eugênio cresceu com inveja dos amigos e vergonha de suas origens, humilde, pobre.
Perdoemos Érico, entretanto, pois ele se redimira no caudal de sua ficção e nas linhas finais regenera Eugênio que acaba por querer mudar o mundo, para melhor, segundo o nobre autor põe na boca do personagem:
“E pense mais nisto: se os técnicos em geral, os cientistas, os médicos, os escritores, os artistas, os economistas trabalhassem juntos e de acordo com um plano bem traçado, poderiam fazer alguma coisa para atenuar os males da Humanidade. Não é possível, está claro, conseguir um Mundo perfeito. Mas não seria absurdo desejar acabar essas incoerências do nosso século. Fome em época de superprodução. Excesso de trabalho para uns e falta de trabalho para outros, e isso na era da máquina. Falta de saúde num tempo em que a Medicina avançou tanto... Seixas fumava em silêncio. Olhou para o amigo com o rabo dos olhos. - Diga-me uma coisa. Você vai mesmo salvar a Humanidade? - É curioso como eu penso agora nestas coisas. Antigamente só pensava em mim próprio. Vivia como cego. Foi Olívia quem me fez enxergar claro. Ela fez-me ver que a felicidade não era o sucesso, o conforto. Uma simples frase deixou-me a pensar: «Considerai os lírios do campo. Eles não fiam nem tecem e no entanto nem Salomão em toda a sua glória se cobriu como um deles.»
Olívia, oliveira, tudo a ver com o Sermão da Montanha.
Em mais um mergulho da Inteligência Artificial, no sentido de “artifício” intencionalmente artístico, e não postiço ou “binário” necessariamente, este cronista que vos fala vê nos Vendilhões do Templo, ali onde Herodes se fez o Grande, assassino de sua própria família e onde Jesus gritou “esta é casa de meu Pai” e expulsou os cambistas, operadores de bit coins daquela época remota que, entretanto, a Igreja Católica preserva em nossas almas, nesse imbróglio histórico-espiritual, vejo um artista plástico, que usa lixo para construir esculturas, de repente tecer um tapete com notas de 500 euros estendido no Altar onde o Sr. Jorge Mário Bergoglio, para os íntimos o Santo Papa Francisco, irá ventilar frases de estímulo muito parecidas no contexto com as de Eugênio, digo, Verissimo. Aquele artista não usou a sua matéria prima costumeira, naquele monumental espaço erigido a custa de milhões de euros pois o mesmo abriga um ex-depósito cartesiano de descartes. O espaço construído para a JMJ 2023 enterra monumental lixão de Lisboa feito um tapete real. Nos últimos 15 meses pós pandemia, quem andava pelas vias de acesso que permeiam a zona industrial de logística de Lisboa, não imaginava o que seriam aquelas obras e ebuliência de vai e vem de máquinas pesadas, concreto e ferro.
No parque urbano do Tejo-Trancão foram aspergidos “investimentos”, nas palavras do Sr. Moedas, na ordem de 21,5 milhões de euros, numa área equivalente ao menor país do mundo, vá lá, cidade-estado, o Vaticano (0,44km2 = 440m2), ou 1/8 do Central Park de New York para o Santo Papa e os Jovens em Jornada Mundial, uma população flutuante segundo estimativas que ronda em 1,5 milhão e assusta lisboetas, segundo manchetes de jornais, entretanto é a metade de uma festa de réveillion na praia de Copacabana. Eu vi, várias delas graças a Deus. Espaço este, da JMJ 2023, equivalente a dois Maracanãs que já abrigou 110 mil pagantes, área do Vaticano, país cidade com população de menos de mil pessoas (900), e é um dos mais ricos do mundo;
o Banco do Vaticano publicou recentemente lucros líquidos de 18,1 milhões de euros e sua direção elenca nomes tais como Giovanni Gay (Alemanha), diretor administrativo da Union Investment Privatfonds GmbH e um dos responsáveis da Union Investment Group; David Harris (Suécia), gerente de portfólio e sócio da Skagen Funds, com experiência em mercados acionários globais e investimentos sustentáveis; John J. Zona (EUA), responsável pelo escritório de investimentos do ‘Boston College’; mais, o Vaticano goza de um arcabouço jurídico do Direito (in)Comum impenetrável, como a Rosa, a biblioteca dos tempos antigos; tão simbolicamente significante da sabedoria e informação quanto da noção de dívida e poder de conceder o perdão (leia-se “dívida”, o verdadeiro precursor do “dinheiro”). Mas vale registrar que até para o perdão há limites: Angelo Caloia, seu ex-presidente (até 2009) foi condenado em 2021 a 8 anos de prisão, junto com o ex-advogado do Banco, Gabriele Liuzzo, pelos crimes de lavagem de dinheiro, peculato e peculato qualificado; vinham abusando da fé fazendo rolo através do Banco do Vaticano com imóveis em Roma e ao redor do mundo.
Por falar em aspergir, acima, foi não foi, ok, serão transplantadas para a área da JMJ 2023 algumas mudas de Oliveira, símbolo nas três religiões monoteistas, o Islamismo, o Judaismo e o Cristianismo, incluindo de borla a Mitologia Grega. E quem olhar com atenção meditatória, pois a oliveira também é sagrada pelo Taoísmo, Hinduísmo e Budismo, para a outra margem do Velho Tejo, poderá perceber olivais onde os mais antigos portugueses ribeirinhos ainda lá vão colher o fruto dessa rica árvore para produzirem em casa o seu precioso azeite. E há ainda os que como meu amigo toureiro Orlando atiram tomates no bidão e conservam nobre caldo para tempero. Fica a receita para os pés rapados ou não de hoje.
Fica também o registo, aqui em oPonto News, retalhos de material enviado para agências de notícias por este pé rapado que escreve: a expressão pé rapado, segundo as más línguas tem uma de suas supostas origens o hábito forçado de terem os pobres que limparem os pés, calçados ou não, à porta das igrejas, antigamente. Os não pé rapados iam à cavalo, ou confortavelmente levados em liteiras por escravos, sim, para todo lado, incluindo igrejas. Não evoluimos muito, eu acho, mas mantenhamos a Fé, custe o que custar, olhemos os lírios do campo…
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